Sunday, November 13, 2011

Toda mudança começa com uma ideia (idéia).

Aqui em Londres, estou morando com portugueses, e o convívio com eles tem sido muito sadio e produtivo. Além das brincadeiras e jantas que fazemos, temos muitas conversas interessantes sobre os mais variados assuntos. No entanto, um que vem se destacando é a Língua Portuguesa. Creio que seja natural que ocorra esse tipo de debate, visto que no próprio ato de falar nos apercebemos diferentes, e aí se geram mais coisas a serem abordadas.

A questão que mais deu pano pra manga e que mais me tocou, no sentido de me pôr a pensar, foi a norma culta. Estávamos conversando sobre as diferenças entre o português brasileiro e o europeu, quando os nossos amigos portugueses disseram: norma culta? A gente nem estuda isso.

O que vimos no Brasil é um total descolamento entre o que se fala e o que se produz e escreve. Parecem água e óleo, não se misturam, mesmo que se force. Um não se interessa pelo outro, e misturá-los é muito difícil. Gostaria de lançar a discussão e de fazer vocês pensarem a respeito da Língua Brasileira, e mais, de como somos ensinados a nos comunicar e escrever no Brasil.

A disciplina de português nos parece uma doutrina, algo sério demais, um ser superior. Estudamos os tempos verbais, as regras de próclise, ênclise e mesóclise (!), as regências nominais e verbais, entre outros, e, no fundo, o que estamos estudando é "como ser entendido em Portugal". De quê nos serve estudar algo de maneira tão minuciosa se só o usamos para escrever em situações restritas, se não somos compreendidos pelos nossos conterrâneos, se não sai com naturalidade? Crescemos a vida inteira ouvindo frases como "Te amo" ou "Não quero te ver hoje!" e estudamos que estão erradas. O português virou uma coisa chata, sem graça, sem pé nem cabeça, desinteressante e, pior, torturante. Não valorizamos as culturas locais, deixamos de discutir neologismos e usos da língua porque estamos estudando como ser compreendidos em Portugal.

Os portugueses nem precisam pensar para escrever, a língua simplesmente se transfere da mente ao papel, não há limites, grades, regras, ela se torna criativa. Nós, brasileiros, estamos presos a uma realidade que nos é diferente, distante, abstrata.

Obviamente não acho que devemos sair por aí e tornar correto qualquer tipo de uso da língua, até porque, inevitavelmente, daqui a alguns séculos poderíamos nem nos entender. Mas trazer uma teoria para mais perto da realidade sempre a torna mais inspiradora, instigante e inteligente. O que se faz nas escolas do Brasil é uma doutrinação linguística, é uma reprodução do que deveríamos falar. Parece que estamos sempre errados, sempre errando, que somos desleixados, que não nos importamos. E a culpa recai, numa espécie de ciclo vicioso, em boa parte sobre os alunos, desinteressados, que não param para pensar sobre a sua identidade linguística, sobre as expressões fonéticas que mais correspondem ao que sentem, sobre a naturalidade do falar. O português está tão distante deles, que a maioria não lê, não escreve e/ou não acha que aquilo seja relevante.

Proponho uma abertura mental, uma abordagem mais relax, uma independência da Língua Portuguesa Brasileira. Que ela se torne livre da nossa preguiça de pensar, de organizar, que ela não seja mais uma vítima da tradição conservadora. Afinal de contas, onde já se viu termos que parar para raciocinar ao escrever, sendo que a escrita nos toca no âmago da subjetividade, da paixão e da inspiração?

Sejamos menos puristas, por favor, e sejamos mais originais. Um país tão grande, rico e transbordando de culturas merece uma identidade mais consolidada. Se demos o nosso famoso jeitinho brasileiro para burlar as regras do português europeu, que sejamos maduros e responsáveis o suficiente para lhe dar uma cara legal e para torná-lo um traço cultural valioso, e não um bicho de sete cabeças.

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